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O lendário quadrinista francês François Bourgeon, enfim
finaliza sua obra prima “Passageiros do Vento” (Les Passagers du Vent, no original) que acabou sendo concluída em seu
7º volume.
Para os seguidores e simpatizantes das HQs é sem dúvida uma
obra imperdível, de primeira grandeza, digna se estar nas melhores coleções, é
considerada uma das melhores series de HQs desde sempre. Uma conceituada
obra-prima.
O que importa é que uma certa veracidade contribui para a
criação do clima pretendido pelo autor". A afirmação é de François
Bourgeon, argumentista e desenhador da série Os Passageiros do Vento, e pode
ajudar a compreender a obsessão dos detalhes que ressalta das aventuras deste
fresco setecentista. E bastaria a leitura do primeiro episódio, “A Rapariga no
Tombadilho”, para o confirmar.
A acção de Os passageiros do Vento decorre no século XVIII,
através das aventuras trágico cómicas de Isa, una nobre a quem foi roubada
identidade, Hoel, um marinheiro francês preso em Inglaterra e libertado por Isa
com ajuda da sua amiga e companheira de viagem Mary.
Num ambiente onde o mar e os navios da época são parte
integrante da história, de uma forma muito documentada, os três vão percorrer a
rota dos navios negreiros. Como parte de retrato fiel da vida a bordo, há
momentos de grande intensidade sexual, tensão e conflitos, retratados de forma
bastante gráfica.
Bourgeon não se limita a tirar partido, com maior ou menor
detalhe, dos mapas encontrados ou dos estudos daquele autor para alguns dos
espaços interiores. De facto, há uma mais-valia evidente no labor criativo do
autor.
Na galeria de personagens da série, Isa é a verdadeira
heroína. Na melhor tradição dos quadrinhos de aventuras, consegue sempre sair
airosamente das situações mais difíceis. Tão hábil a manusear a pistola como o
fuzil ou a faca, revela-se, no contexto histórico do final do século XVIII, uma
mulher livre, para quem a condição feminina não é uma limitação.
A liberdade de acção e de ideias, que exibe com orgulho num
mundo de homens, fazem dela uma criatura que seria mais provável nos primórdios
dos movimentos de emancipação feminista do século XX. François Bourgeon defende
a sua personagem com convicção: "Não me parece de todo impossível que se pudesse é encontrar a mesma sensibilidade [das feministas] em certas
mulheres do século XVIII". Nisso a obra coloca-se atualíssima o que a
reforça como trabalho de excelência a ser conhecido.
"Não me parece de todo impossível que se pudesse é encontrar a mesma sensibilidade [das feministas] em certas mulheres do século XVIII".
Antes de ser heróica, a história de Isa é trágica: ao trocar
a roupa com a sua amiga de infância, Isa torna-se Agnes e esta usurpa-lhe o
estatuto e a condição de fidalguia. Ao perder o seu lugar natural no mundo, a
heroína é encerrada num convento e será, anos mais tarde, violada pelo seu
próprio irmão. Começa então um percurso, quase sempre tenaz e por vezes brutal,
para recuperar a identidade perdida.
O resultado final é assim sintetizado por Michel Thiebaut
numa obra consagrada à construção da série (Les Chantiers d'une Aventure):
"O trabalho do autor começa frequentemente onde acaba a documentação, cuja
qualidade é uma condição necessária.
O seu olhar desloca-se no espaço para melhor nos levar a
descobri-lo sob diferentes ângulos. Será necessário sublinhar que um tal modo
de ver exige infinitamente mais trabalho do que uma simples sucessão de planos,
mais ou menos relacionados, sob um mesmo ângulo.
Passageiros do Vento é um resgate e uma mostra da força que
os quadrinhos têm como veículos de força histórica, de entretenimento
inteligente e conteúdo, numa época onde a urgência das mídias superficializa a 7ª
arte, Bourgeon é o comandante no corajoso da Nau dos quadrinhos de qualidade!